Poucos países no mundo passaram por uma transformação tão profunda e acelerada quanto a China nas últimas quatro décadas. Desde o fim dos anos 1970, o país deixou de ser uma economia agrária fechada para se tornar uma potência global em inovação, produção e urbanismo. O que muitos não sabem é que, nesse percurso, as cidades planejadas foram uma ferramenta essencial para viabilizar essa virada histórica.
O ponto de virada: as reformas de 1978
Em 1978, sob a liderança de Deng Xiaoping, a China deu início a um amplo processo de reforma econômica e abertura ao mercado internacional. A estratégia era clara: permitir a propriedade privada em certos setores, abrir o país ao capital estrangeiro e acelerar a industrialização.
Foi nesse momento que a urbanização ganhou um papel central na visão de futuro da China. A ideia era simples, mas ambiciosa: criar cidades com infraestrutura moderna, conectadas às novas zonas industriais, e capazes de atrair investimentos e mão de obra qualificada.
Shenzhen: de vila de pescadores a polo tecnológico
Um dos exemplos mais emblemáticos é Shenzhen. Até o início dos anos 1980, era uma pequena vila costeira no sul do país. Com a criação da primeira Zona Econômica Especial, Shenzhen passou por um processo de urbanização planejada e se tornou, em poucas décadas, um dos principais polos tecnológicos do mundo, sede de empresas como Huawei, Tencent e DJI.
Ali, o planejamento urbano foi mais do que uma questão estética: foi estratégia de desenvolvimento econômico.

Urbanismo com propósito: o modelo chinês
Ao longo dos anos, a China replicou esse modelo em diferentes escalas e regiões:
• Pudong (Xangai): planejado como distrito financeiro internacional;
• Dongguan: cidade voltada à manufatura eletrônica;
• Suzhou Industrial Park: criado em parceria com Cingapura, com foco em tecnologia e inovação;
• Chengdu, Wuhan, Chongqing: cidades do interior que receberam grandes investimentos para descentralizar o crescimento das regiões costeiras.
Essas cidades foram desenhadas para integrar produção, moradia, lazer e mobilidade urbana de forma coesa e orientada ao crescimento.

Planejar cidades para transformar economias
Ao pensar em cidades como motores de desenvolvimento, a China adotou uma visão de longo prazo. Urbanização, nesse contexto, não era um efeito colateral do crescimento — era uma ferramenta para alcançá-lo. E para isso, o país apostou em infraestrutura robusta, mobilidade eficiente, planejamento logístico e políticas públicas integradas.
Hoje, mais de 65% da população chinesa vive em áreas urbanas — um salto impressionante, considerando que esse número era inferior a 20% em 1978. Essa mudança foi central para o surgimento de uma nova classe média chinesa, mais conectada, produtiva e consumidora.
O que aprendemos com esse movimento?
Na Mayresse, acreditamos que a arquitetura e o planejamento urbano têm o poder de transformar realidades. O exemplo chinês é uma prova de que, com visão estratégica e compromisso com o futuro, é possível reconfigurar não só a paisagem urbana, mas o próprio tecido econômico e social de um país.
Entender o passado recente da China é, também, refletir sobre como planejamos nossas cidades, bairros e edifícios hoje — e qual futuro queremos construir com eles.